TRISTEZA (2)
Felicidade tirana
É fato: a
obrigação de ser feliz o tempo todo está virando uma obsessão a ponto de
causar angústia. “A felicidade é efêmera por definição. Por isso, as
pessoas que só pensam nela sofrem muito mais e se distanciam das
pequenas alegrias da vida”, afirma o escritor francês Pascal Bruckner,
autor do livro A Euforia Perpétua (Bertrand Brasil, 2002), no qual
critica o que chama de “tirania da felicidade”. “Hoje em dia, sofre-se
também por não querer sofrer, do mesmo modo que se pode adoecer de tanto
procurar a saúde perfeita.” Não é à toa que os antidepressivos são um
sucesso arrebatador nas farmácias. Para se ter uma idéia, em 2000, o
Prozac, propagado como a “pílula da felicidade”, rendeu 2,6 bilhões de
dólares aos cofres do laboratório fabricante. “É bom lembrar que essas
drogas não fazem efeito em pessoas normais, ou seja, em quem não sofre
de depressão. As substâncias antidepressivas não são necessariamente
estimulantes”, diz o psiquiatra Eduardo Ferreira-Santos, do Instituto de
Psiquiatria da Universidade de São Paulo.Evitar a tristeza vem sendo um ideal tão perseguido que está chamando a atenção de pesquisadores do mundo todo. A conclusão: estar infeliz é mais do que natural, é necessário à condição humana. Segundo o psicólogo americano Martin Seligman, da Universidade da Pensilvânia, a tristeza é um dos raros momentos que nos permite reflexão, uma volta para nós mesmos, uma possibilidade de nos conhecer melhor, de saber o que queremos, do que gostamos. E somente com essa clareza de dados é que podemos buscar as atividades que nos dão prazer, isto é, que nos fazem felizes.
Ferreira-Santos concorda. “A tristeza com relação a algum fato nos leva a pensar sobre ele. Pensamos em soluções, ou seja, trata-se de um mecanismo psíquico que nos dá condições de reflexão sobre nós mesmos e até mesmo para evitar a repetição do erro.” Assim como a dor e o medo, a tristeza nos ajuda a sobreviver. Sim, porque se não sentíssemos medo, poderíamos nos atirar de um penhasco. E se não tivéssemos dor, como o organismo poderia nos avisar que algo não vai bem?
Insatisfação passageira
O
pesquisador americano Robert Wright acredita que a tristeza tenha sua
participação até mesmo no processo evolutivo. “Se a alegria que vem após
o sexo não terminasse nunca, os animais copulariam apenas uma vez na
vida”, diz Wright. Para ele, a felicidade é propositadamente projetada
para escapar – e dessa forma corremos atrás daquela maravilhosa sensação
que sentimos anteriormente. Um estudo feito em 1978 com ganhadores da
loteria mostra o caráter momentâneo da felicidade: os sortudos tiveram
picos de alegria logo após a premiação, mas tenderam a voltar aos níveis
anteriores pouco tempo depois. O inverso é verdadeiro. No mesmo estudo,
pessoas que ficaram paraplégicas em acidentes recuperaram seus níveis
de felicidade dois meses depois. Ou seja: a tristeza, quando é um
sentimento saudável e natural da vida, tem fim. Se não passar, aí é bom
se preocupar, pois pode virar depressão, doença que afeta cerca de 20%
da população mundial.“Mas tem muita gente que confunde as coisas, diz que está deprimido porque perdeu o emprego ou brigou com a namorada. Isso não é depressão, é tristeza. Depressão é uma síndrome e nunca vem isolada”, afirma o psiquiatra Ricardo Moreno. Foi o que aconteceu com a administradora de empresas Patrícia Menziane, de 25 anos. “Depois de perder um bebê, me senti muito mal. As pessoas me cobravam uma volta por cima, me incentivavam a sorrir, mas não dava. Demorou para descobrir que eu não era infeliz, apenas estava infeliz”, conta.
Um dos pilares do budismo é a impermanência, segundo a qual tudo é transitório, em constante mudança. Para Dalai Lama, se as coisas podem ficar ruins de um momento para outro, as ruins também podem ficar boas rapidamente. O ideal é aprender os recados da tristeza enquanto ela não vai embora.
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